sexta-feira, 9 de maio de 2014

Metáfora

Não olha no meu olho
Pois sabe que a faísca ainda está
Amor, não deixa a chama apagar
É fogo dormido, louco pra se alastrar.

Foge do meu toque
Tem medo de se entregar
Mas quando sorri
Mostra tudo o que há.

domingo, 4 de maio de 2014

Prato do dia

Hoje eu resolvi fazer um macarrão. Sentei à mesa e mastiguei as minhas memórias. Coloquei ketchup e lembrei que tu adotou a mania também. Tive de engolir não só a comida, mas os dias felizes em que chegávamos da aula e tu ia logo preparar a nossa refeição. Essa refeição. As nossas risadas intermináveis e graças que só a gente poderia entender. Quase não digeri quando me veio os pega-pegas em volta da mesa. A mão onde não devia. Os meus beijos pelo teu rosto inteiro. As lambidas também, as quais tu odiava, gostando.
Tu fazia o prato, eu fazia palhaçada. Era foto fazendo careta, era careta ao cortar a cebola. Era eu a te tirar a atenção. Era minha atenção toda para ti. Me pendurava no teu pescoço, enquanto tu dizia que precisava cuidar das panelas. A cara de quem no fundo não queria que eu desse um passo dali. “Tu é louca”, repetia. E era. Louca por ti. Pelos teus trejeitos simples e impensados. Pelos olhos ingênuos e olheiras que denunciavam a nossa falta de horários.
Hoje eu sentei na cadeira em uma cozinha que ainda me é estranha. E senti o vazio cutucar aqui dentro. A solidão de não ouvir a tua voz se gabando. De não ter com quem falar de boca cheia. De não ter o encostar espontâneo das mãos entre uma garfada e outra.
Não era só a comida que a gente dividia. Era o alimento. O que faz ficar de pé. Era amor.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Demorou a dormir. Fitava o teto branco compulsivamente. O vazio daquela cor era tão semelhante ao peito dela... Lutou até que o peso dos olhos cantasse vitória. Ela não queria adormecer, por medo de sonhar o que a mente precisa parar de lembrar. Contudo, no inconsciente, uma onça a visitou. A menina então lutara com muita força contra o bichano para se salvar. Conseguiu. Entretanto, os arranhões eram gritantes. Quase uma cópia da realidade. Ainda assim, ela não queria acordar, pois sabia que dormir era um refúgio. Mas o fez, no susto. Tentava pegar no sono de novo para esquecer. Não obteve resultado.

A cabeça escorada no roupeiro. Meia hora sentada para acreditar.

Para criar coragem de enfrentar um mundo que já foi tão colorido e hoje é cinza. Levantou, não havia outra saída. Vestiu qualquer coisa. Até se arrumar perdeu o sentido. Aqueles riscos de delineador que faziam parte do olhar dela já não se via mais, trocou pelo leve roxo das olheiras. Sem perceber, pegou a camiseta que tinha tudo a ver com sua vida. "Vai demorar uns dias a voltar a sorrir", dizia.

Embora agradável para a maioria das pessoas, o clima não ajudou naquele dia. Ventava e doía no estômago. As arestas do buraco que foi aberto parecem sangrar ao sentir tudo passando reto. Ela ligou o botão do automático e não sabe quando vai desligar, nem mesmo se vai recordar o lugar onde ele fica. Andam dizendo até que ela vai sumir se não voltar a se alimentar direito. Cabeça dura, nem se importa.

Caminhara naquele dia sem sentir o próprio corpo, como se não fosse dona dele. Conta ela que certa hora tentou uma distração. Ler um livro seria ótimo, não fosse pelo bilhete de amor que encontrara entre a capa e a primeira página. "Coincidência sacana, hein", espraguejou com as mãos na cabeça. O choro veio junto de questionamentos e lembranças... As fotos dos últimos dias felizes ficaram apenas com ela. Últimos, porém tão recentes. Doeu. Não consegue compreender.

Sabe que será assim por um vasto tempo. Nem por isso a guria sabe lidar. É torta até o último fio de cabelo. Mete os pés pelas mãos como se não existisse consequências. Se move quando deve ficar parada e fica imóvel quando precisa agir. Assim mesmo, toda atravessada. Palavra essa que era motivo de um riso duplo... Mas nada mais é em dois. Ouviu de alguém que está "metade" do semestre anterior. Como ele adivinhou? Agora, o saldo é negativo. Nem uma pessoa inteira.
Ela precisa acostumar a ter uma vida silenciosa de novo. No entanto, o silêncio nunca foi tão torturante. Agressivo. Ela não sabe como. O nó na garganta não afrouxa, sufoca.

Anestesiou de uma forma que não consegue enxergar direito. As horas se arrastam. A realidade é uma incógnita.

Ela precisa parar, precisa correr. Precisa pensar, precisa esquecer.


Precisa aprender.



E então, amar.